As Meninas de Velázquez e o pintor na sociedade de corte

por Homero Nunes
Diego Velázquez (1599 – 1660) foi um pintor da sociedade de corte. Dependia das encomendas para produzir e exibir sua obra, uma vez que viveu em uma época anterior às galerias, museus e ao mercado burguês da arte. Tornou-se um exímio retratista e enfrentava diretamente os retratados, ao invés dos críticos, figuras que só apareceriam na sociedade capitalista burguesa posterior. Um talento incrível preso às amarras de uma sociedade de aparências, reverências, estamental. Mas Velázquez soube ser criativo e transbordar o seu tempo em arte, tornando-se referência na pintura espanhola de todos os tempos, influenciando os grandes artistas conterrâneos desde Goya a Dalí e Picasso.
 
Em As Meninas, Velzáquez pintou cenas dentro de cenas, na encenação de si mesmo pintando a família real espanhola na intimidade da corte de Felipe IV, em 1656. O pintor aparece na tela em autorretrato: em pé, segurando um pincel, com a cruz de Santiago em escarlate no peito, de frente ao quadro que pintava, o qual aparece no cavalete exposto no canto. Contudo, a cena principal é a da infanta, preparada por suas “meninas”, ou amas, para posar junto aos pais. Estes, o rei a e rainha, estão fora da cena, mas aparecem no reflexo do espelho ao fundo, denotando a posição de frente ao pintor e todos mais. Ao fundo, ao lado do tal espelho, um homem abre uma entrada de luz que compõe o jogo de claro escuro. Uma beata e um guarda-damas vigiam tudo por trás, como fazia a igreja na corte católica da Espanha. Uma anã e outra criança, em destaque junto ao cão deitado, favorecem a atmosfera de intimidade no lado de dentro da vida na corte. A iluminação que vem da janela ilumina a cena pintada e a cena a ser pintada, pois todos se posicionam no canto de luz do salão sombreado ao fundo, com pé direito alto e quadros na parede. Uma riqueza de detalhes que deu a Velázquez a eternidade e a todos nós a experiência estética de uma pintura genial. Museu do Prado, Madrid.

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