A inquietação é o que difere um simples pintor de um grande artista, título este apropriado para Rodrigo Andrade. Ao longo de mais de três décadas, seu interesse é no fazer artístico – tanto na forma como na visualidade. Tatear novas linguagens o conduziu a descobertas a respeito da própria matéria de seu ofício: a tinta.
Até 12 de março de 2018, a Estação Pinacoteca do Estado de São Paulo apresenta uma retrospectiva intitulada Rodrigo Andrade: Pintura e Matéria (1983-2014), mostra que faz parte de uma revisão promovida pelo museu sobre influentes artistas surgidos na década de 1980. São pelo menos 100 trabalhos divididos em três salas que denotam a multiplicidade de sua obra. Não somente nos planos figurativo e abstrato, mas, sobretudo, na materialidade da tinta.
Rodrigo Andrade surgiu em 1982, quando ele e outros colegas de profissão decidiram montar um ateliê numa vilazinha do bairro Cerqueira César, em São Paulo. Essa turma ficou conhecida como o grupo da Casa 7, nome que alude ao número da residência onde o ateliê se instalara. Entre os integrantes, Carlito Carvalhosa (1961), Fábio Miguez (1962), Nuno Ramos (1960) e Paulo Monteiro (1961).
Após a inclinação neoexpressionista no início de sua carreira, a partir dos anos de 1990 Andrade desenvolveu o que seria uma de suas marcas mais emblemáticas: volumes grossos de tinta. Iniciou essa trajetória compondo formas geométricas monocromáticas (círculos e retângulos) preenchidas por camadas espessas de tinta que se relacionavam entre si num fundo neutro. Anos mais tarde, valendo-se da mesma técnica, direcionou sua experiência para a série Matéria Noturna, que foi exposta na 29ª Bienal de São Paulo. Nestas obras, grossas camadas pretas que lembram borracha, cujas cisões são preenchidas com cores que evocam a luz noturna de lâmpadas, postes e faróis. Naturalmente, os cortes na matéria são o resultado de seu histórico com o uso de estêncil, solução encontrada pelo artista para desenvolver esse trabalho que exibe, de maneira singular, a antítese entre escuridão e luz.
A exposição contempla a pluralidade de sua obra. Há diversos conjuntos de quadros que nos revelam não somente como a tinta foi elemento de transformação, mas, também, como a fotografia influenciou sua produção. Exemplo desta vertente são as telas Pinturas de Estrada, que remetem a fotos realizadas em viagens.
Certamente não passará despercebido Cemitério ao Entardecer (2012), que compõe a série A Velha Ponte de Pedra e Outras Pinturas, assim como Pinturas do Mundo que Flui, cujo nome talvez tenha sido inspirado no Ukiyo-e (Retratos do Mundo Flutuante), xilografias e pinturas japonesas concebidas entre os séculos XVII e XIX que influenciaram vários artistas impressionistas.
Para um artista, o caminho mais difícil, porém, mais desafiador, é o da constante investigação, da inquietude. Pelo que consta, este é o temperamento de Rodrigo Andrade.
por Juliano Mignacca
Instagram @issocompensa