Vonnegut, Daguerre, o Matadouro e os primeiros nudes da história

por Isso Compensa

“A mulher e o pônei posavam diante de cortinas de veludo franjadas de bolinhas. Dos dois lados havia colunas dóricas. Diante de uma das colunas, uma palmeira dentro de um pote. O retrato que Weary tinha era uma cópia da primeira fotografia obscena da história. A palavra fotografia foi empregada pela primeira vez em 1839 e foi também naquele ano que Louis J.M. Daguerre revelou à Academia Francesa que uma imagem formada numa chapa de metal prateado coberta com uma fina camada de iodeto de prata podia ser revelada na presença de vapor de mercúrio.

Em 1841, apenas dois anos mais tarde, um assistente de Daguerre, André Le Fèvre, foi preso nos jardins das Tulherias procurando vender a um senhor um retrato da mulher e do pônei. Foi também lá que Weary comprou o seu retrato, nas Tulherias. Le Fèvre argumentou que o retrato era artístico e que a sua intenção era reviver a mitologia grega. Disse que a prova disto eram as colunas e a palmeira.

Quando lhe perguntaram qual era o mito representado pela foto, Le Fèvre respondeu que havia milhares de mitos semelhantes, sendo a mulher uma simples mortal e o pônei um deus.

Foi condenado a seis meses de prisão e lá morreu de pneumonia. Coisas da vida.”

Kurt Vonnegut

Matadouro 5, 1969

VONNEGUT, Kurt. Matadouro 5. Porto Alegre: L&PM, 2016. Pág. 46.

Tradução de Cássia Zanon

Recumbent female nude, Amélie – Félix-Jacques Moulin1852-1853

Imagem de capa:

A primeira fotografia na qual aparece uma pessoa viva, foi realizada da janela de Louis-Jacques Mandé Daguerre, no Boulevard du Temple, Paris, em 1838. Na verdade, duas pessoas: um engraxate e seu cliente, que aparece melhor definido com o pé na caixa. A rua retratada está deserta, mas é provável que outras pessoas circulassem por lá. Como a imagem demorou 7 minutos para ser capturada, as coisas em movimento não foram congeladas no tempo. Os dois personagens, portanto, devem a aparição ao serviço minucioso do engraxate, que demorou no lustro dos sapatos daquele senhor. A câmera foi batizada de Daguerreótipo.

A fotografia foi uma invenção coletiva, com vários pesquisadores trabalhando para capturar quimicamente uma imagem pela incidência de luz, desde o século XVIII. Joseph Niépce foi o pesquisador que iniciou os processos que Daguerre levou adiante culminando na imagem que ilustra esta postagem. Daguerre apresentou sua conquista à Academia Francesa de Ciências em 1939, quando a palavra fotografia foi empregada pela primeira vez. 


Foto mais antiga tirada por Niépce, por volta de 1826.

Os primeiros Nudes

Não se sabe ao certo qual fotógrafo começou a produzir fotografias eróticas e imagens de nus, contudo, o francês Félix-Jacques Moulin ficou famoso em meados do século XIX, por suas fotografias de mulheres peladas. Precursor do estilo, Moulin tinha um estúdio em Montmartre e desde 1849 montava cenários para que as jovens tirassem roupas e retratos. Foi preso e teve seu material confiscado algumas vezes, mas o sucesso das fotos valia o risco para ele. Desde então, todo um mercado de “imoralidades” se abriu para a fotografia. Nudes mil. 

Daguerreótipo colorido de Félix-Jacques Moulin, 1851-1854

PS.: a historinha do livro Maradouro 5, de Kurt Vonnegut, é fictícia. Não existe a tal fotografia histórica da mulher e o pônei e Daguerre não teve um ajudante chamado André Le Fèvre, preso nas Tulherias vendendo uma foto obscena. Coisas da literatura.

Segue o link para baixar o sensacional livro de Kurt Vonnegut sobre a Segunda Guerra Mundial e as coisas da vida:

Matadouro 5 – Kurt Vonnegut


Sobre os autores

Acompanhe