Invadindo a intimidade do ambiente, Vermeer lança luz (através da janela) sobre a “Moça com Jarro de Leite” absorta em sua tarefa cotidiana e banal. Perdida em pensamentos, alheia ao olhar do espectador, ela irradia sua beleza simples e quieta num ambiente humilde de paredes rachadas e mesa pequena. Detalhes e minúcias, dobras e sombras, coisas do lar, silêncio em amarelo e azul.
Pode parecer estranho, nestes tempos de corpos à mostra e de fácil vislumbre, mas esta tela foi considerada sensual — e mesmo erótica — no século XVII. A luz que ilumina o volume do corpo, o gesto delicado, a boca do jarro aparente, aberta e profunda, o leite derramado aos poucos, devagar, na medida certa da expectativa do olhar. Sensualidade que brota de fora da cena, daquele que observa tudo sem ser percebido, que olha a mulher distraída de sua presença, que vê o cotidiano pelas lentes da oportunidade, que espia a cena pela fresta do próprio desejo.
Sobre Vermeer, compensa ver o filme: Moça com Brinco de Pérola de 2003
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