Nietzsche, a mentira e a cristalização das metáforas

por Matheus Arcaro

O que Nietzsche nos fala sobre a mentira? 
Que ela não existe efetivamente, assim como não existe a verdade. O que nós chamamos de verdade é a cristalização de um modo genuinamente metafórico de enxergar o mundo, peculiar ao ser humano.


A verdade é uma “metáfora cristalizada”, ou seja, algo que é repetido muitas vezes e que se torna canônico aos olhos de um povo. Ela aparece não por uma questão epistemológica, mas por uma questão social/moral e biológica, com a finalidade de regular os inter-relacionamentos humanos e possibilitar a formação de uma comunidade; com a finalidade de conservação da espécie. O homem precisa de um acordo de paz para que a “guerra de todos contra todos” não prevaleça.


Concebendo a verdade como possibilitadora da vida social, Nietzsche chega a um contraste entre verdade e mentira: “o mentiroso usa as designações válidas, as palavras para fazer aparecer o não-efetivo como efetivo; ele diz, por exemplo: ‘sou rico’, quando para seu estado seria precisamente ‘pobre’ a designação correta”. Em termos simples: o mentiroso é aquele que não usa os termos convencionados socialmente.

O homem não odeia a mentira. O que o homem odeia é ser prejudicado tanto por uma, quanto por outra. Se o resultado da mentira é benéfico, então a verdade, em oposição, não é desejada, mas, até mesmo, repelida.Criticando a verdade, Nietzsche mostra a decadência de uma sociedade cientificista. Esta confiança ignorante nos preceitos e valores científicos constitui-se na negação do que o homem possui de mais humano. E, por negar sua humanidade, Nietzsche diagnostica o homem moderno como doente, propondo a arte como um medicamento capaz de levar à cura.

Matheus Arcaro é mestrando em filosofia contemporânea pela UNICAMP. Pós-graduado em História da Arte. Graduado em Filosofia e em Comunicação Social. É professor, artista plástico e escritor, autor do romance “O lado imóvel do tempo” (Patuá, 2016) e do livro de contos “Violeta velha e outras flores” (Patuá, 2014). Está lançando Amortalha, livro de contos, também pela Patuá.

*As tirinhas que ilustram esta publicação são de autoria de Charles Barsotti (1933 – 2014), publicadas originalmente na revista The New Yorker, a partir dos anos 1970.

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