A urgência de Habermas para o Século XXI

por Matheus Arcaro

Em época de fake news, da propagação de discursos de ódio e de debates rasos na mídia e nas redes sociais, resgatar os conceitos de “razão comunicativa” edemocracia deliberativa” pode ser útil para o atual cenário político Brasileiro.

 

 

O filósofo alemão Jürgen Habermas nasceu em 1929 e foi assistente de Theodor Adorno por muitos anos. Desenvolveu sua carreira em várias universidades alemãs, sendo o mais importante representante da Escola de Frankfurt na atualidade.

O pensamento de Habermas transita em várias esferas. Contudo, suas reflexões mais contundentes são em filosofia política. O filósofo faz uma análise da sociedade capitalista e afirma que, em seus primórdios, o capitalismo constitui-se um espaço de discussões nos quais diferentes ideias sociopolíticas foram debatidas. Os salões de café, os clubes literários, as revistas e os jornais foram meios que proporcionam essa esfera pública tipicamente burguesa. Todavia, a evolução do capitalismo implicou o declínio desta esfera pública.

 

Jürgen Habermas. Foto: Gorka Lejarcegi.

Com a cultura de massa, que subtrai a autenticidade do espaço de confronto de ideias, a esfera pública (embora se amplie com a inclusão do conjunto da população) perde sua profundidade. Eis que acontece a “colonização do mundo da vida pelo mundo do sistema”. Aqui emerge um de seus principais conceitos: razão comunicativa. O mundo da vida, contrariamente à razão sistêmica, deveria ser conduzido pela razão comunicativa que, grosso modo, pode ser definida como a comunicação livre, racional e crítica como alternativa à razão instrumental e superação da razão iluminista “aprisionada” pela lógica instrumental.

A proposta de Habermas é de reconstituição de uma autêntica esfera pública, não mais burguesa, e, sim, cidadã, a partir das instituições da sociedade civil e de movimentos sociais emancipacionistas, estabelecendo-se um espaço social de debate no qual vigore a razão comunicativa, ou seja, aquela que se desenvolve intersubjetivamente, livre da dominação ideológica do sistema e por meio do exame público dos argumentos expostos.

Deste modo, existe a possibilidade de uma moralidade sustentada racionalmente ou, nos termos de Habermas, de uma ética do discurso: contexto de comunicação no qual os cidadãos sejam capazes de abstrair-se de suas condições de vida particulares e de deslocar-se para a posição do outro, ou seja, de avaliar racionalmente os conteúdos expostos no debate, levando-se em apreço o conjunto da sociedade. Saltaríamos assim da teoria à prática: o agir comunicativo numa democracia que, de fato, mereça este nome: a democracia deliberativa, em que a legitimidade das decisões e ações políticas deriva da deliberação pública da maioria, pelos cidadãos, em geral, livres e iguais.

Matheus Arcaro é mestrando em filosofia contemporânea pela UNICAMP. Pós-graduado em História da Arte. Graduado em Filosofia e em Comunicação Social. É professor, artista plástico e escritor, autor do romance “O lado imóvel do tempo” (Patuá, 2016) e do livro de contos “Violeta velha e outras flores” (Patuá, 2014). Está lançando Amortalha, livro de contos, também pela Patuá.

 


Sobre os autores

Acompanhe